30 Anos da Constituição Cidadã e o Papel do Ministério Público

por Antonio Araldo Ferraz Dal Pozzo

“Aplaudimos o MP no combate à corrupção, mas convém salientar que os remédios judiciais requeridos muitas vezes matam o doente”

Quando assumi a assessoria do Procurador-Geral de Justiça de São Paulo, logo percebi que o Ministério Público era uma Instituição com uma fantástica ideia a realizar no seio da sociedade – mas que carecia de mecanismos jurídicos adequados e infraestrutura humana e física. O Promotor era o único servidor de sua “repartição”, tendo que fazer tudo sozinho, ocupando uma sala emprestada pelo Judiciário, que lhe cedia telefone e até o cafezinho. Muitas vezes, o Promotor pagava pelo papel que utilizava.

Estávamos em 1975.

Então, eu e um grupo de colegas resolvemos ingressar na política institucional, ganhando as eleições para a Associação Paulista e, depois, para a Conamp, órgão nacional.

A história desse tempo pode ser encontrada em alguns livros: “Uma História sem Fim” de J. Cabral Netto (publicada pela Conamp); “Histórias da Vida – Constituinte 20 anos”, publicada pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul e “Vinte e Cinco Anos do Novo Perfil Constitucional”, da Malheiros, escrito por mim, por Walter Paulo Sabella e por José Emmanuel Burle Filho.

O texto aprovado pelo constituinte fala por si mesmo: o Brasil ganhou um Ministério Público sem igual no mundo!

Mas, a mens legislatoris e a própria mens legis acabaram cedendo lugar a uma interpretação que vinha a atender aos reclamos urgentes do País, forçando uma exegese constitucional necessária na prática, mas falha conceitualmente.

Na verdade, nós queríamos que o Ministério Público fosse o fiscal dos fiscais – o que ficou impresso no inciso II do art. 129: “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia”.

Ou seja, ao invés de o MP ser o tutor da sociedade, deveria forçar seus mecanismos a atuar em prol dos cidadãos e, também, quando os próprios direitos dos Poderes Públicos fossem violados pelos particulares. Entendíamos que uma sociedade que saiba se defender é mais democrática e justa que uma sociedade debaixo de uma proteção ministerial.

Mas, não foi o que aconteceu, por vicissitudes históricas. As pessoas jurídicas de direito público, por exemplo, não patrocinam ação por improbidade administrativa, entregando tal função ao Ministério Público. O que pretendíamos é que o Ministério Público processasse o órgão com competência para aquela ação, caso permanecesse inerte.

Contudo, essa inversão de papéis trouxe um problema sério, grave, para nós previsível: desfocou os limites entre o campo de atuação funcional do MP (poder de agir em prol da sociedade, conquistado por concurso público) e a área de atuação do Poder Executivo (poder político, conquistado nas urnas). Essa constatação é fácil: basta consultar qualquer Prefeito Municipal para saber a quantidade de ofícios expedidos pelo MP para obter informações, quase sempre sem justificativas e invadindo áreas discricionárias da administração. Muitas Prefeituras Municipais tiveram que criar setores especiais somente para responder aos ofícios do Ministério Público!

Aplaudimos o MP no combate à corrupção, mas mesmo nessa área também convém salientar que os remédios judiciais requeridos muitas vezes matam o doente, como a medida cautelar de proibição de contratar com o poder público.

Trinta anos se passaram…

A evolução do MP é impressionante. Já não mais é um organismo pobre. Nenhum outro experimentou, em tão pouco tempo, essa evolução!

Porém, é mais que tempo de se fazer uma séria introspecção e de focar mais objetivamente o campo de ação ministerial, dosar os remédios legais e buscar soluções plausíveis para o grande problema da violência e da criminalidade, onde tem atuação exclusiva.

 

 

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