Aspectos fundamentais acerca dos reflexos da pandemia da COVID-19 nos contratos de prestação de serviços e medidas de mitigação
por Ana Cristina FecuriEm tempos especiais como o presente, medidas especiais também devem ser tomadas e acompanhadas com precisão cirúrgica pelos gestores contratuais
As diversas medidas adotadas pelos governos estaduais, municipais e federal para conter a propagação do coronavírus (COVID-19) têm provocado impactos nas contratações públicas em curso, com reflexos sérios e negativos, o que vem exigindo, por parte das partes contratantes, uma atuação efetiva e imediata não somente para minimizá-los, como também para que os ajustes se mantenham vigentes.
Embora caiba ao Administrador Público, na qualidade de gestor público, avaliar os reflexos diretos e indiretos nos contratos em execução e identificar as soluções viáveis, a fim de adotar medidas que preservem a contratação, também caberá ao particular contratado se acautelar quanto à implementação dessas ações. Logo, as adaptações contratuais que se fizerem necessárias em razão desta difícil e nova realidade merecerão atenção redobrada.
Toda e qualquer alteração ou revisão contratual haverá de ser prévia e detidamente analisada, amplamente justificada e estar relacionada com a pandemia, além de respeitar os rigores legais e constitucionais. Os objetos contratuais não poderão ser transfigurados. O mesmo cuidado deverá ser observado com eventuais prorrogações contratuais.
As suspensões ou diminuições de ritmo das execuções contratuais que ocorrerem em decorrência da pandemia da COVID-19 deverão ser precedidas das devidas justificativas por parte do Administrador Público, e geraram efeitos econômicos negativos, os quais deverão ser demonstrados pelo contratado e custeados pelo Estado.
Embora a álea contratual originada pelo coronavírus não possa ser considerada ordinária, a documentação das ocorrências será de fundamental importância para evidenciar o nexo causal entre a pandemia e a onerosidade contratual ou a impossibilidade fática de sua execução.
As contratações emergenciais decorrentes do evento pandêmico, por outra sorte, embora autorizadas pelas novas hipóteses de dispensa legalmente previstas, a exemplo da contida no artigo 4º da Lei 13.979/20, também haverão de receber a devida motivação do caso concreto, haja vista a necessária diminuição do risco de exposição em que as empresas devem encontrar-se ancoradas, evitando responsabilizações futuras.
Quer-se com tudo isso dizer que os impactos provocados nos contratos pela COVID-19 não são uma carta em branco, razão pela qual o particular contratado deverá estar muitíssimo atento a estas questões, monitorando-os de perto em suas minúcias, a fim de evitar apontamentos indevidos em seus contratos por parte dos órgãos de controle. Em tempos especiais como o presente, medidas especiais também devem ser tomadas e acompanhadas com precisão cirúrgica pelos gestores contratuais, de forma a perpassar por esse complexo momento de maneira racional e segura.
E justamente com o intuito de resguardar os direitos dos contratados em suas contratações, e evitar eventual imputação de responsabilidade conjunta por eventuais irregularidades contratuais, seja por parte dos Tribunais de Contas, seja pelo Ministério Público, é que se apresentam as seguintes recomendações, sem prejuízo de outras:
proceder à análise da alocação de riscos contratuais previstos no contrato administrativo firmado com o Poder Público, a fim de identificar os limites de suas obrigações;
noticiar e documentar, nos autos do processo administrativo contratual, todas as intercorrências contratuais decorrentes do estado pandêmico que assolou o País, com o intuito de impedir ou mesmo mitigar os reflexos negativos, e subsidiar futuros pleitos de reequilíbrio contratual ou uma eventual rescisão contratual;
informar ao fiscal do contrato sobre todo e qualquer fato que impossibilite ou atrase o cumprimento dos prazos contratuais fixados, a exemplo da escassez de produtos ou indisponibilidade de mão de obra, relacionando-os com a pandemia, de maneira a demonstrar a ausência de culpa no descumprimento contratual;
certificar-se de que a Administração contratante está cumprindo todas as exigências legais para a devida formalização dos termos de alteração quantitativa e qualitativa do objeto, prorrogações contratuais, assim como para a formalização de contratações emergenciais.
As orientações propostas servem como um alerta para tomada de medidas mitigadoras efetivas nos contratos de prestação de serviço em andamento, ressaltando a necessidade de uma análise específica das suas cláusulas, as normas administrativas editadas pela entidade contratante, bem como as normas gerais de regência, de forma que se possa construir um caminho seguro para traspassar esse difícil momento, evitando o rompimento dos contratos, a manutenção de sua performance financeira em virtude de processo de revisão contratual e a neutralização de eventuais responsabilidades que venham macular a idoneidade das partes contratantes, especialmente em face de um cenário de incertezas acerca da interpretação que tribunais judiciais e administrativos terão diante dessa intricada situação.
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